Acabei de ver um vídeo da coordenação de formação da RCC que pretende explicar o chamado “dom de línguas” . Neste vídeo o coordenador tenta colocar as “bases” de fundamentação. É patente a falta de argumentação teológica séria, embasada na doutrina católica. O formador baseia-se somente no empírico, no subjetivismo sentimental que é próprio dos protestantes. Há uma ausência de solidez que chega ao nível das fábulas. A teologia é uma ciência enquanto usa a razão para interpretar o seu objeto que é Deus e Deus revelado pelas Escrituras. E aí entra a metafísica, como filosofia primeira. Falta teologia e teologia católica aqui. É necessário, antes de tudo, o que nos ensinou S. Anselmo de Cantuária: ” compreender para crer” e isso se faz pelo exercício científico e não pelo uso de lendas, fábulas ou outro artifício.
Veja o Vídeo
Postamos abaixo um segundo vídeo que embora protestante, condena e nega a existência do chamado “dom de linguas”
Por fim, a posição de S. Tomás de Aquino, que é a a doutrina católica sobre o assunto, por Eder Moreira
Pe. Marcélo Tenorio
Quando se trata das sublimes verdades da Revelação Divina, é preciso recorrer, por prudência, aos magistrais ensinamentos dos doutores da Igreja, especialmente à sabedoria angélica de Santo Tomás.
A explicação do Aquinate sobre o dom de línguas dissolve as dúvidas e estabelece as bases para distinguir o verdadeiro fenômeno sobrenatural da glossolalia dos pseudo-carismas, vulgarizados nos círculos delirantes da Renovação Carismática.
Comentando o Capítulo XIV da primeira carta de São Paulo aos Coríntios, Santo Tomás escreveu:
“Quanto ao dom de línguas, devemos saber que como na Igreja primitiva eram poucos os consagrados para pregar ao mundo a Fé em Cristo, a fim de que mais facilmente e a muitos se anunciasse a palavra de Deus, o Senhor lhes deu o dom de línguas” (S. Tomas de Aquino, comentário à primeira Epístola aos Coríntios, Tomo II, p. 178).
Esse ensino é comum a todos os doutores que comentaram o referido trecho da carta de São Paulo.
O dom de línguas, largamente concedido aos cristãos do primeiro século da
Igreja, destinava-se a facilitar o anúncio do Evangelho que precisava ser difundido a todos os povos de todas as línguas existentes. Entretanto, como observa o Aquinate, os Coríntios desvirtuaram o verdadeiro sentido desse dom:
“Porém, os coríntios, que eram de indiscreta curiosidade, prefeririam esse dom ao dom da profecia. E aqui, por ‘falar em línguas o Apóstolo entende que em língua desconhecida e não explicada: como se alguém falasse em língua teutônica a um galês, sem explicá-la; esse tal fala em línguas. E também é falar em línguas o falar de visões tão somente, sem explicá-las, de modo que toda locução não entendida, não explicada, qualquer que seja, é propriamente falar em língua” (S. Tomas de Aquino, comentário à primeira Epístola aos Coríntios, Tomo II, p. 178-179).
Segundo a exposição do ilustre doutor angélico, o falar em línguas pode ser entendido de dois modos:
1) falar em língua desconhecida, porém existente, como sucedeu em Pentecostes, quando São Pedro falou em sua língua e cada um dos presentes entendeu na sua língua pátria.
2) pregação ou oração sobre visões ou símbolos.
Essa doutrina é confirmada pelo Aquinate:
“Suponhamos que eu vá até vós falando em línguas (I Cor 14,6). O qual pode entender-se de duas maneiras, isto é, ou em línguas desconhecidas, ou a letra com qualquer símbolos desconhecidos” (S. Tomas de Aquino, comentário à primeira Epístola aos Coríntios, Tomo II, p. 173).
Por sua clareza inconfundível, a primeira forma de falar em línguas dispensa comentários, visto que consiste em falar, miraculosamente, uma língua existente sem nunca tê-la estudado.
Consideremos, portanto, o segundo modo, que consiste numa simples predicação com linguagem pouco clara, como acontece quando se fala sobre símbolos ou visões em forma de parábolas.
Esclarece São Tomás:
“[…] se se fala em línguas, ou seja, sobre visões, sonhos […] (S. Tomas de Aquino, comentário à primeira Epístola aos Coríntios, Tomo II, p. 208).
Continua:
[lhes falarei] “‘Em línguas estranhas’, isto é, lhes falarei obscura e em forma de parábolas […] por figuras e com lábios […]” (S. Tomas de Aquino, comentário à primeira Epístola aos Coríntios, Tomo II, p. 200).
Segundo a doutrina puríssima de Santo Tomás, quem usa de símbolos nos exercícios espirituais, lucra o mérito da prática de um ato de piedade. Mas, se compreende racionalmente os símbolos que profere durante a ação, lucra, além do mérito da boa obra, o fruto da compreensão intelectual de uma verdade espiritual.
Quando alguém reza a oração do Pai Nosso sem compreender o profundo significado das petições que pronuncia, ganha o mérito da boa ação de rezar. Mas, aquele que reza compreendendo o sentido do que diz, lucra duplamente, isto é, o mérito da ação e o mérito da compreensão de uma verdade espiritual. Por esta razão São Paulo exorta aos que “falam em línguas” (no sentido de usar símbolos em seus atos de piedade) para que peçam o dom de interpretá-las, isto é, de compreender aquilo que diz de modo simbólico, a fim de lucrarem juntamente com a boa ação, o entendimento daquilo que piedosamente executam.
Quanto ao uso público dessas línguas estranhas, o Apóstolo estabelece que não se as use quando não houver intérprete para explicar os símbolos para os que não conseguem atingir sua clara compreensão.
Em seus comentários sobre o versículo em que São Paulo adverte para que, durante o culto público, não se fale em línguas mais que dois ou três, São Tomás ensina que a leitura da Epístola e do Evangelho na Missa, são formas de falar em línguas que a Igreja manteve do período apostólico, fato diametralmente oposto ao que ocorre nas histerias pentecostais.
Eis as palavras do Aquinate:
“É de notar-se que este costume até agora […] se conserva na Igreja. Por que as leituras, epístola e evangelho temos em lugar das línguas, e por isso na missa falam dois […] as coisas que pertencem aos dom de línguas, isto é, a Epístola e o Evangelho” (comentário à primeira Epístola aos Coríntios, Tomo II, p. 208).
A interpretação dessas línguas – estranhas ao povo simples – ocorre na Missa após a leitura da Epístola e do Evangelho, quando o padre faz o sermão explicando os símbolos contidos nos textos sagrados que foram lidos.
Nisto consiste o “falar em línguas”, segundo a autoridade indiscutível de Santo Tomás. E, partindo desta teologia absolutamente segura, porque reconhecida pela Igreja, não há como admitir a confusão desordenada de sons, freqüentes nos cultos pentecostais da Renovação Carismática. Ao contrário, quem examina os escritos dos pais da Igreja sobre o assunto, é levado a concluir que os fenômenos de línguas que ocorrem na RCC são de origem diabólica, e não divina, como se pensa e defende.
E para respaldar essa afirmação, confirmamo-la com os próprios dizeres dos padres da Igreja.
No século II da era cristã, Santo Irineu condenou um herege chamado Marcos que profetizava sob influência demoníaca, seduzindo mulheres que, de modo semelhante ao que ocorre nas reuniões pentecostais, passavam a emitir sons confusos:
“Então, ela, de maneira vã, imobilizada e exaltada por estas palavras e grandemente excitadas […] seu coração começa a bater violentamente, alcança o requisito, cai em audácia futilidade, tanto quanto pronuncia algo sem sentido, assim como lhe ocorre” (Contra Heresias I, XIII, 3).
Fenômeno semelhante aconteceu com o herético Montano, conforme relata Eusébio:
“Ficou fora de si e [começou] a estar repentinamente em uma sorte de frenesi e êxtase, ele delirava e começava a balbuciar e pronunciar coisas estranhas, profetizando de um modo contrário ao costume constante da Igreja […] E ele, excitado ao falar de duas mulheres, encheu-as com o falso espírito, tanto que elas falaram “extensa, irracional e estranhamente, como a pessoa já mencionada” (História da Igreja V, XVI: 8,9).
No século III, Orígenes denunciou um tal Celso, que pronunciava sons incompreensíveis:
“A estas promessas, são acrescentadas palavras estranhas, fanáticas e completamente ininteligíveis, das quais nenhuma pessoa racional poderia encontrar o significado, porque elas são tão obscuras, que não têm um significado em seu todo” (Contra Celso, VII:9).
Nota-se, portanto, que a confusão sonora nos ambientes carismáticos se identifica com esses fenômenos denunciados como falsos ou diabólicos pelos pais da Igreja.
Na afirmação constante dos doutores, o dom de línguas consiste em falar línguas estranhas existentes, e não sons desconhecidos por todos os homens. Encontramos essa posição em todos os comentadores dos textos de São Paulo, como por exemplo, em Santo Agostinho, Cirilo de Alexandria, Gregório Nanzianzeno, Santo Ambrósio, São João Crisóstomo, Didaquê Siríaca, etc.
Esse sempre foi o ensino da Igreja iluminada pela luz infalível do Espírito Santo.
Para encerrar essa questão, sem desprez
ar as objeções correlatas, respondemos a indagação do consulente Fábio que recorda as palavras de São Paulo, cujo teor parece contrariar a idéia de que o dom das línguas é um carisma extraordinário, isto é, concedido apenas a alguns.
Orientando os Coríntios, o Apóstolo expressa seu desejo: “Desejo que todos faleis em línguas”. (I Cor, XIV, 5).
Santo Ambrósio, Doutor da Igreja, ensina que o falar em línguas não se manifesta em todos os cristãos:
“Todos os dons divinos não podem existir em todos os homens, cada um recebe de acordo com a sua capacidade” (Do Espírito Santo II, XVIII, 149).
É compreensível que, em vista da necessidade da propagação da fé a todos os povos, São Paulo manifeste o desejo de que todos tenham o dom de línguas. Mas o Apóstolo sabe que a cada um é dado um dom particular.
Sobre seu estado celibatário, São Paulo diz: “Quisera que todos os homens fossem como eu” (I Cor, VII, 7). Entretanto, imediatamente pondera: “[…] mas cada um recebe de Deus o seu dom particular, um, deste modo; outro, daquele modo”.
E esse mesmo princípio pode ser aplicado ao dom das línguas, que se tornava cada vez mais incomum, conforme se difundia a fé entre os povos.
Para não estender demasiadamente esta carta que já vai longe, indico uma resposta dada pelo professor Orlando Fedeli sobre o significado da expresão “gemidos inefáveis”, objeto da dúvida do sr. Fábio.
Noutra oportunidade poderia transcrever as explicações dos doutores sobre esses “gemidos” que, por serem inefaveis e provenientes da Terceira Pessoa da Santíssima Trindade, são inaudiveis e inatingiveis pela razão humana
Ademais, ousar dizer que os “grunhidos” carismáticos são gemigos inefáveis do Espírito Santo é, além de absurdo, uma blasfêmia contra a Sabedoria de Deus. Claro, supondo que um carismático já tenha “ouvido” os gemidos do Espírito Santo para identificá-lo com o gemido confuso dos carismáticos.